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Harvard doa US$ 100 milhões para reparação da escravidão

A Universidade Harvard disponibilizou no dia 26 de abril um documento que detalha sua conexão histórica com a escravidão nos Estados Unidos e anunciou um fundo de US$ 100 milhões destinado a estudar e “reparar” essas ligações.

As descobertas foram divulgadas em um relatório de 130 páginas, fruto de uma pesquisa encomendada pelo atual reitor de Harvard, Lawrence Bacow, em 2019. A universidade, no entanto, começou a falar publicamente sobre suas conexões com a escravidão em 2016. Naquele ano, foi colocada uma placa em seu campus homenageando quatro pessoas escravizadas que trabalharam para dois presidentes diferentes de Harvard nos anos 1700.

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Estátua de John Harvard, no campus da universidade (Jens Junge/Pixabay)

A investigação incluiu um grupo de pesquisadores que analisou os nomes e as histórias de pessoas que trabalharam sem remuneração para a universidade. O comitê descobriu que Harvard e seus líderes, incluindo quatro dos ex-presidentes da instituição, escravizavam pessoas. Segundo os autores, o novo relatório se soma a um trabalho anterior, iniciado em 2007 por professores e alunos de Harvard para mostrar a conexão da universidade com a escravidão.

Harvard é a universidade mais antiga dos Estados Unidos — foi inaugurada na cidade de Cambridge, Massachusetts, em 1636, quando a área ainda era uma colônia do Reino Unido. Na época, era permitido que pessoas trabalhassem sem remuneração. O relatório observa que, no período, a escravidão era comum no ocidente e uma parte importante da economia nas colônias, e “moldou de forma poderosa a Universidade Harvard”. Por exemplo, algumas pessoas que financiaram Harvard no início de sua história ficaram ricas comprando e vendendo escravizados.

Os pesquisadores responsáveis pelo relatório disseram ainda que Harvard agora faz parte da “longa e crescente lista” de universidades americanas “ligadas à história da escravidão”.

Anos de escravidão

Pessoas escravizadas trabalharam na universidade por quase 150 anos, até que a escravidão se tornou ilegal em Massachusetts, em 1783. O documento da universidade revelou que pelo menos 70 negros e nativos americanos foram escravizados — isso inclui pessoas que trabalhavam no terreno da universidade e nas casas dos dirigentes da instituição.

Além disso, a universidade, que é a mais abastada dos EUA, enriqueceu investindo em indústrias, como algodão e cana-de-açúcar, que utilizavam o trabalho forçado. Essas colheitas foram cultivadas por pessoas escravizadas, principalmente no sul dos Estados Unidos e nas ilhas do Caribe. Muitos edifícios em Harvard recebem o nome de pessoas que possuíam escravos.

O relatório observa que Harvard lucrou com a ideia de que a escravidão nos Estados Unidos estava centrada no sul do país, longe da região onde a universidade se situa. Segundo o relatório, porém, a economia das colônias no nordeste dos EUA também “foi próspera” por causa de sua ligação com a escravidão e negócios que utilizavam trabalho forçado.

Os pesquisadores disseram que provavelmente havia mais de 70 pessoas escravizadas, mas conseguiram localizar apenas 70 nomes. Eles acrescentaram que algumas das pessoas escravizadas eram nativos americanos. Muitos dos escravizados eram conhecidos apenas por seus primeiros nomes, como Cesar, Dinah, Delia, Renty e Venus.

Fundo para “curar feridas”

Bacow anunciou o fundo de US$ 100 milhões para lidar com o que ele chamou de “efeitos corrosivos [da escravidão] em indivíduos, em Harvard e em nossa sociedade”. O dinheiro será usado para compensar os maus-tratos às pessoas que trabalharam para a universidade, mas não será pago diretamente aos familiares vivos dos escravizados de Harvard.

Os autores do relatório defenderam que a universidade deveria permitir que alguns estudantes de faculdades e universidades historicamente negras estudassem em Harvard por um ano.

Eles também disseram que a escola deve tornar a educação mais acessível para os descendentes de escravizados no sul dos EUA e na área do Caribe. Além disso, os pesquisadores alegaram que Harvard deveria oferecer programas educacionais para membros de tribos nativas americanas do nordeste dos EUA.

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Ideias “perturbadoras”

Ainda de acordo com o relatório, mesmo depois que a escravidão se tornou ilegal, alguns dos professores da universidade ensinaram teorias raciais que defendiam a supremacia branca. Por exemplo, alguns docentes fizeram estudos sobre raça que os pesquisadores ligaram às políticas adotadas por líderes da Alemanha nazista. O relatório chamou alguns desses trabalhos, que incluíam fotografar negros sem roupas e medir seus corpos, de “abusivos”.

Bacow classificou as descobertas como “perturbadoras e chocantes” e disse que as ideias permitiram atividades profundamente “imorais”.

Em tempos mais modernos, observou o relatório, a universidade demorou a disponibilizar educação e trabalho para afro-americanos. Entre as décadas de 1890 e 1940, somente cerca de três homens negros frequentavam a universidade por ano. Em 1960, o número havia crescido apenas para nove.

Compensando a escravidão

Os autores do relatório defendem ainda que a universidade deveria gastar dinheiro para compensar o passado, mas não dizem exatamente que a escola deveria dar dinheiro aos descendentes dos escravizados que trabalharam por lá. Os pagamentos para compensar maus tratos no passado são comumente chamados de “reparações”. Harvard, em vez disso, disse que compensará seus erros por meio de “ensino, pesquisa e serviço”.

Outras universidades estão tomando ações semelhantes

A Universidade de Georgetown, em Washington, D.C., está tentando arrecadar US$ 400.000 por ano para dar aos descendentes dos escravizados vendidos pela escola. Já a Universidade de Princeton, em Nova Jersey, iniciou um fundo de US$ 27 milhões para compensar pessoas escravizadas. Por fim, a Universidade da Virgínia, fundada pelo presidente dos EUA, Thomas Jefferson, criou bolsas de estudo para os familiares vivos daqueles que escravizou.

No entanto, alguns críticos dizem que essas universidades deveriam fazer mais ou que não estão cumprindo suas promessas. Agora que Harvard divulgou seu relatório, espera-se que seja feita uma auditoria de como US$ 100 milhões são gastos e se o fundo faz alguma diferença.

No relatório, Bacow observou que Harvard está “longe de ser perfeita”, mas sempre tenta “ser melhor”. O presidente da universidade disse que a universidade está comprometida em seguir as recomendações e “abraçar os desafios que temos pela frente”.

Universidades historicamente negras dos EUA

O documento menciona as faculdades e universidades historicamente negras dos Estados Unidos. Essas instituições são conhecidas pela sigla HBCU (Historically Black Colleges and Universities). Elas foram criadas antes da Lei dos Direitos Civis de 1964, com a intenção de fornecer educação para a comunidade afro-americana. Confira aqui 10 dessas universidades e conheça a história por trás da criação de cada uma delas.

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Lucas Almeida
AUTOR

Mineiro, jornalista e mestrando em Comunicação. Entusiasta de idiomas, viagens e cibercultura. Tem o sonho de mudar o mundo, uma pauta de cada vez.

04 Mai 2022

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